Uma das contribuições mais importantes de Ron Minson foi atualizar as teorias de Alfred Tomatis e esclarecer certas confusões sobre o
funcionamento da terapia do som, especialmente no que diz respeito à
atenção. A maioria dos neurocientistas tem encarado a atenção como uma “função
cortical superior”, o que significa que é processada na fina camada externa do
cérebro. Há muito se sabe que os lobos frontais — no “topo” do cérebro — ajudam
a estabelecer metas, manter-se no rumo e desenvolver tipos mais abstratos de
pensamento; eles são necessários para manter a atenção. Os neurocientistas
partiam do princípio de que as dificuldades de concentração eram causadas por
problemas no lobo frontal. Esse pressuposto era corroborado pelo fato de que,
nos escaneamentos cerebrais, as pessoas com TDAH apresentam lobos frontais
menores que as pessoas mais atentas.
A confusão que Minson ajudou a solucionar é esta. Os sinais da terapia sonora não vão diretamente para os lobos frontais, mas às diferentes áreas subcorticais, por baixo do córtex, envolvidas no processamento dos estímulos sensoriais.
Como, então, podem melhorar a atenção?
A terapia do som pode corrigir problemas de atenção estimulando todas as áreas
subcorticais.
Recentes estudos de escaneamento cerebral mostraram que pessoas com
TDAH também têm menor volume cerebral no cerebelo (que, cabe lembrar, é
responsável pelo ajuste fino do controle
do tempo dos pensamentos e movimentos,
assim como do equilíbrio). Com o agravamento do TDAH, o cerebelo diminui mais
ainda. Contudo, o cerebelo aumenta quando o paciente melhora. As crianças com TDA que não
conseguem esperar sua vez ou respondem sem pensar às vezes têm dificuldade de controlar o tempo de
seus atos. A terapia da escuta inventada por Tomatis e o iLs influenciam o
cerebelo, além de terem um enorme impacto no sistema vestibular, que está
ligado a ele. O acréscimo de exercícios de equilíbrio, através do iLs, estimula
ainda mais o cerebelo.
A música utilizada na terapia
do som aciona e fortalece a conexão entre áreas do cérebro que processam a recompensa positiva (que nos dá uma
sensação de prazer quando fazemos algo) e a ínsula, uma área cortical do
cérebro envolvida no ato de prestar atenção. Isto só foi demonstrado em 2005, pelos neurocientistas Vinod
Menon e Daniel Levitin, usando imagens por ressonância magnética funcional.
O estímulo do sistema
vestibular com a terapia da música e do movimento faz com que ele envie sinais
a outra área subcortical, os gânglios basais, que também fazem parte do
circuito da atenção. As pessoas com TDAH têm menores gânglios da base. Normalmente, esses gânglios
contribuem para manter o foco de atenção, impedindo o cérebro de fazer qualquer
coisa que não esteja relacionada à tarefa principal. Prestar atenção a alguma
coisa exige a inibição da tentação de voltá-la para outra. Por outro lado,
quando os gânglios da base são insuficientemente ativos, as pessoas tendem a
pular antes de olhar, o que pode evidenciar-se na forma de hiperatividade e dispersão.
Existe um vínculo direto entre o ouvido e o nervo vago. A terapia do som, como explicam Minson e Pointer, estimula o nervo vago, que inerva o canal auditivo e a membrana timpânica. Stephen Porges demonstrou que o sistema vagal tem muitas ramificações. Já vimos que ele aciona o sistema nervoso parassimpático, para acalmar a pessoa. Isto é particularmente importante em crianças com distúrbios de atenção e outros problemas de desenvolvimento, pois com frequência se mostram muito ansiosas e em reações de luta ou fuga.
Mas existe um outro aspecto do sistema vagal, chamado de “vago esperto” por Porges;
ele permite que a pessoa preste uma atenção focada, comunique-se e se prepare
para aprender. O estímulo do vago com o tipo adequado de terapia do som pode
deixar a pessoa num estado de calma focada, como sabem muitos que gostam de
música.
Outra área subcortical
estimulada pela música é o sistema de ativação
reticular. Reticular significa “em forma de rede” ou “semelhante a uma rede”, e seus
neurônios têm curtas conexões uns com os outros, de modo que realmente parecem
uma rede. Esse sistema de ativação está alojado no tronco cerebral. Recebe
estímulos de todos os sentidos e processa informações para determinar o grau de
vigília ou de excitação e de atenção que uma pessoa precisa. Quando um
despertador soa de manhã, faz com que o sistema de ativação desperte o córtex.
Quando acionado no modo “alto”, o sistema de ativação desperta uma pessoa
insuficientemente estimulada — como acontece com muitas pessoas com TDA,
frequentemente num estado sonhador. Isso energiza o córtex de baixo para cima.
As áreas subcorticais do
cérebro são as primeiras a receber sinais do
ouvido. Nas pessoas que têm problemas subcorticais e são incapazes de administrar
as sensações, o córtex auditivo não recebe os sinais nítidos e fortes de que
precisa para exercer sua função. Mas, segundo Minson, elas podem compensar, em
certa medida, caso se esforcem muito mais para prestar atenção. (Já vimos antes
esse tipo de utilização do córtex desempenhando atividades subcorticais: John
Pepper usava os lobos frontais para fazer o trabalho dos gânglios da base,
quando exercitava sua técnica da caminhada consciente.) O problema é que esse
processo é exaustivo. Ron resume da seguinte maneira: “Se a organização
subcortical é insuficiente, é necessário usar todos os recursos corticais para
desempenhar essas funções subcorticais. Ao nos voltarmos para o subcórtex, o
que estamos fazendo é melhorar a organização cerebral de baixo para cima.” Essa
prodigiosa descoberta não se aplica apenas a pessoas com TDA e TDAH, mas a muitas
crianças com distúrbios de aprendizado e problemas sensoriais, assim como às do
espectro autístico, pois todas elas enfrentam problemas subcorticais.
Trecho retirado do livro “O cérebro que cura” Norman Doidge